sexta-feira, 4 de março de 2011

Mulher negra: saúde, afetividade e discriminação

       No rico imaginário brasileiro, a mulata faceira passa com graça. Na realidade, a lata d'água na cabeça fez a Maria ir muito pouco adiante. Tropeçou em todos os obstáculos que as circunstâncias colocaram em seu caminho. Nenhuma transformação social conseguiu arranhar a visão plurativa, cheia de contornos que envolve a mulher negra.

       As evoluções ocorridas por intervenções culturais estranhas, e os parâmetros econômicos impostos ao longo de nossa história, a transformaram em ser oculto, periférico, que não aparece por sua desimportância.
O desprezo, concebido na intolerância e gerado na certeza da inferioridade do outro, ao liberar sua ação, tal como a caixa de pandora, avilta e dificulta sua sobrevivência moral, física, emocional, condicionando seu psicológico

       A sociedade quando constrói imagens que ressaltam as diferenças, trabalham princípios de poder e hierarquias, grandes definidoras de lugares sociais. Neste contexto, a libido construída, a reduz a pura função sexual. Seu corpo e capacidade reprodutiva são invisíveis para si própria e sua descendência feminina.

       Só a ficção, com seu aparato fantástico e seu testemunho mudo, pode apreender a dimensão dos acontecimentos. O ciclo da escravidão, alimentou-se profundamente em suas entranhas, nada lhe sendo concedido ou levado em consideração. O nada incluso É o outro, sem rosto, sombra que se esgueira, pois tudo lhe é nefasto. Concebe do patrão e do escravo. As hierarquia e bonanças constroem-se e se consolidam às suas custas, à margem das satisfações que poderiam, quem sabe, fixá-la como um ser humano produtivo que, afinal, é. Das mezinhas que mantém a saúde, à cantiga de ninar, construiu o arquétipo da casa grande. De suas forças e talento, nasceu um Estado. Estranha e misteriosa,sua linguagem e costumes colaboraram na elaboração do corpo social, na integração dinâmica de experiências comuns – abordagem de ideias e emoções -, sempre como referência oculta.

       Último elo do processo, penúltimo era o escravo, homem,com maior poder de barganha, sofreu estupros sistemáticos, a tal miscigenação, a mulata faceira. As doenças e a falta de afetividade, não só lhe moldaram o caráter, como também lhe inocularam todas as pestes do mundo:má alimentação, e doenças física e mentais.

      A sociedade que ajudou a construir oferece-lhe lugar no quarto de empregada. A realidade que a oprime serve de teses e ela nunca é convidada para o coquetel. Mas... não quer, como o negativo, ser obscurecida por teorias cínicas. Não quer, como o arlequim, ser a boba da corte e sentir o menosprezo à sua sensibilidade. Não quer, como o pirilampo, destraçar-se em seu brilho, que existe, mas é fugaz.

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